#22 Atrasei, mas cheguei chegando
Criolo canta há anos que “não existe amor em SP”. Embora eu discorde um pouco, entendo o ponto de vista dele. Para mim, existe amor, família, amigos, arte - muita arte! comida e muita coisa legal!
Oi, tudo bem? Como estamos por aí?
Por aqui, tudo dentro da normalidade da vida, sendo sobressaltada pela dita ansiedade mas já com toda nostalgia instalada na sala de controles. #spoilers Divertida Mente 2! Aliás, fico imaginando como o filme deve ter virado o assunto principal nas sessões de terapia mundo afora. Psicólogos e psicanalistas devem estar de saco cheio dos pacientes que chegam falando: “então, minha ansiedade quebrou o painel e atropelou o tédio”. No entanto, não tem como ser diferente. Mesmo para quem não faz análise, o filme reverbera e destrincha as nossas emoções de uma maneira muito didática e bonita. Não é um filme infantil e muito menos só para adolescente. E, como disse a Maria Ribeiro, o que interessa mesmo é entendermos o nosso senso de ser…
Sampa
Muito antes do Criolo, teve Adoniran Barbosa, Caetano, Itamar Assumpção e até Rita Lee cantando São Paulo. A maior cidade do país não esconde suas mazelas, escancara à luz do dia o mundo zumbi das drogas ao mesmo tempo em que exibe toda a sua desigualdade em imóveis espelhados, restaurantes luxuosos e bairros nobres lindíssimos. Ela te abraça e também te rejeita e te diminui, como bem canta Criolo. Eu amo. #dsclp
E, assim como o Brasil, a cidade não é para amadores e não queira ir em uma galeria de arte no Morumbi, visitar uma exposição em Pinheiros e passar pela casa que abriga, momentaneamente, a maior coleção de tapeçarias do Rubem Dario, nos Jardins. Depois, voltar para Higienópolis, tomar banho e sair pra jantar… nos Jardins.
Você vai perder MUITO tempo e dinheiro andando de Uber. Pois é… eu fiz isso e valeu cada centavo gasto nessa logística insana. Ainda assim #cuidadocomaburra (estou toda engraçadinha usando hastags….)
Embora tenha passado por todo o perrengue de me demorar mais no deslocamento do que nos lugares, foi uma alegria conhecer a Pinakotheke e a exposição Monumental que exibe obras de 5 artistas nacionais contemporâneos da icônica geração dos anos 80. E mais ainda, ver o desbunde de um ipê invadir a casa e se transformar em mais uma obra de arte.
Depois do almoço, mais um uber (alô, me patrocina aqui!) e fui ao Instituto Tomie Ohtake que está recebendo a exposição Calder + Miró. O mais impressionante é que todas as obras expostas pertencem a colecionadores nacionais. Ou seja, a relação do norte-americano Alexander Calder (aquele dos móbiles!) e do espanhol Joan Miró com o Brasil se converge nessa afinidade tropical e impalpável. Não sei se essa frase faz algum sentido, mas eu entendi a exposição dessa maneira e quis fazer uma graça…
Eu sou apaixonada por Miró há muitos anos. Assim, como pela arte espanhola de um modo geral. Miró tem essa questão abstrata, mas tão sonhadora, infantil com o predomínio das cores primárias misturadas com o preto. Ao entrar na primeira sala de exposição, vemos livros ilustrados pelo artista, poemas e textos lindamente ”transcritos” em suas linhas e figuras irreais. Arrepiante…. E o mais emocionante - pra mim - foi ver o livro, de raras e pouquíssimas cópias (apenas 125,) escrito pelo poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto, sobre o pintor e ilustrado pelo próprio. É uma preciosidade.
Antes de sair da sala, tive um pequeno diálogo iniciado por um senhor que nunca vi na vida.
Dá para perceber o traço solto. A mão livre.
Sim, são lindos. Criativos, respondi.
São encantadores.
Pequeno silêncio. E ele complementa:
Daqui para lá, eu não sei qual o mais bonito. Mas repare sempre no tom de azul. Eu prefiro os que têm azul.
Confesso: depois disso, só reparei nos azuis e chorei diante de alguns deles.
Depois de me recompor dessa emoção, carregar um pouco o celular, tomar um sorvete (contarei, em algum momento) e pedir mais um Uber, fui parar nos Jardins para conhecer mais uma galeria de arte.
Um adendo: eu acho que perdi a vergonha de entrar em galerias de arte. Sempre me senti mal, pois sei que as obras estão ali expostas para vermos com a intenção de comprá-las. Tenho a certeza de que quando entro em uma, a pessoa responsável já me olha com aquele jeito que SABE que eu NÃO vou comprar nada e muito menos entendo do assunto - bom, é tudo verdade, né?! No entanto, percebi que isso é um problema do outro e não meu. Agora, sou defensora de que as galerias de arte deveriam ser mais frequentadas por todos nós, meros mortais apreciadores de arte. É de graça, tem obras, artistas e histórias interessantes e que aumentam a qualidade do nosso repertório e da construção do nosso gosto. Claro, se arte for algo que você goste e aprecie. Se não, nem entre mesmo!
Chega de papo de Uber. Enfim parei na Passado Composto, galeria que está com uma exposição gigantesca do Rubem Dario - mais de 70 obras entre tapeçarias e pinturas em guache. Tudo muito colorido e bem brasileiro. Dario é tio da minha amiga Ana Tereza e o maior orgulho de sua mãe, tia Anna Lúcia, irmã do artista e uma das responsáveis pela catalogação e preservação de sua obra. Reconhecido como o “mágico das cores”, suas tapeçarias são super vibrantes e quase todas enormes. Aliás, mais uma constatação, o mundo da tapeçaria é maravilhoso! Vale explorar.
De quebra, ainda sentei e quase dormi em uma réplica da poltrona icônica “Jangada” de Jean Gillon, que ainda é reproduzida - com a autorização dos herdeiros - em lotes pré-vendidos (?) para os colecionadores de plantão. Custa R$ 68 mil… #socueeerrrrrooooo
AH! A Passado Composto parece aquela casa do filme UP, embora seja enorme, com um jardim lindo - assinado, obviamente. Ela sobrevive imponente à especulação imobiliária do bairro, espremida entre duas construções monstruosas. Ao mesmo tempo que é triste, não deixa de ser um lindo símbolo de resistência.
Minha ida a São Paulo teve um objetivo específico de acompanhar a recuperação cirúrgica da minha irmã, mas eu também tinha pequenos planos. Não consegui fazer todos, mas estive com meus sobrinhos - constatação pós viagem, agora, a maioria deles mora em SP - consegui ver duas amigas queridas e no fim, fiz o que podia. Fica sempre a sensação de quero mais e um volto logo ainda não programado no radar!
PS: se bem que volto na próxima cartinha contando um pouco mais das peripécias em terras paulistanas!
Comida em SP, sempre um capítulo à parte
Não estava na programação fazer grandes aventuras gastronômicas, até porque o objetivo era que eu cuidasse da minha irmã e isso incluía cozinhar! Então, o que mais fiz foi conhecer os mercadinhos em volta da casa dela. E tem para todos os gostos, sabores e bolsos.
No entanto, por recomendação da Camila Perlingeiro (acompanhe ela aqui), fui almoçar em um restaurante coreano - Sagunja, ao lado da Pinakotheke. Nem adianta pedir o cardápio, você mal consegue entendê-lo e a própria atendente não sabe explicar a comida: “nunca provei, não tenho coragem”, disse-me ela, espantada por eu encarar a tal da sopa superhipermega apimentada. Com toda a razão: foi impossível de comer.
Sogogui Dubu Tingue é uma caldeirada de pasta de pimenta com carne e legumes. Praticamente só comi o tofu. Como era o prato do dia, ele vinha acompanhado de mil entradinhas frias, como alga, acelga, batatas e cebolas cozidas e caramelizadas, um peixe seco e muito doce (tinha um nome específico, não anotei!), kimchi e uma salada de lula, simplesmente perfeita (e muito generosa). Obviamente, não dei conta de tudo! Eu sei que tem muito restaurante pra ir na cidade, mas vale conhecer lugares não badalados, originais e com um quê de tradicional.
Minha irmã mora em Higienópolis, e fiquei impressionada com a proliferação de padarias de fermentação natural pelo bairro. O que é ótimo. Atrás da casa dela tem a Na Janela - PERFEITA. Minha irmã falou: a Rita Lobo considera o melhor beigale da cidade. Eu, que nem sabia o que era, amei e descobri que a padaria é do Luiz Américo Camargo, autor dos livros Pão nosso e Direto ao pão, produzidos pela própria Rita Lobo e publicados pela Editora Panelinha. Ah! Beigale é uma rosquinha judaica que parece uma rosquinha com muito gergelim. Maravilhosa!!
Qual é a música, Pablo?
O Marcelo Janot, jornalista, crítico de cinema, DJ, nas horas vagas ainda faz bico de professor e amigo, foi esperto e fez uma homenagem aos 80 anos de aniversário do Chico Buarque criando uma playlist com 80 músicas do compositor carioca. Comemorado em junho, acho que deveríamos transformar o aniversário do Chico em feriado nacional. Como bem disse Arthur Dapieve, outro jornalista carioca, na sua participação durante o programa da Globonews, Chico é um artesão da palavra. E isso é um baita elogio!
Cotidiano, Construção, A Banda, João e Maria (amorzinho pra sempre…), A Rita, Vai Passar, Meu Guri… não dá para enumerar… Escutei incessantemente esse compilado de músicas preparado pelo Janot, em várias eu chorei - Geni é ferrar a cabeça -, em outras tantas, lembrei muito da minha mãe mas sobretudo, senti falta de uma das músicas mais bonitas dele… Beatriz - coincidência ser o nome de duas das minhas grandes amigas de vida - foi composta com o Edu Lobo para o espetáculo Grande Teatro Místico e gravada pelo Milton Nascimento. É poesia musicada.
Obrigada por chegar até aqui.
Se cuide, ouça a arte, veja arte, assista arte.
Beijocas e até loguinho
Rê