#28 Bem-vinda, Menopausa
Não foi chamada, não pediu licença, não disse a que veio. Aos poucos foi tomando conta de tudo. Bagunçou a tabelinha, mexeu com a memória, escancarou o cansaço e cutucou o prazer sexual.
Oi, tudo bem? Como anda a vida?
Não sei você, mas ultimamente fazer escolhas do que assistir, ouvir ou ler, não tem sido uma tarefa fácil. A oferta de podcast, filmes, séries e livros é gigantesca e isso tem me gerado uma certa angústia e frustração.
Estou lendo Uma verdade indigesta para o clube de leitura Comer Palavra que me inscrevi neste segundo semestre e na fila está Coraline que já me comprometi para o Gole de Cultura (outro grupo de leitura). Nesse meio tempo, em um ataque de pelanca, comprei mil livros em promoção na Amazon e no sebo da Escola de Escrita. Quando vou lê-los?
Tem a minissérie nova da Nicole Kidman, O Casal Perfeito - bem ruinzinha, aliás -, mas tem Notting Hill passando pela 59a vez e eu “perco” quase 2h assistindo aquela sequência que já sei de cor e salteado. Amo demais e não sinto culpa. Naquele momento só estou fantasiando a vida mas no dia seguinte, me pergunto: por que, gente, por que?
No curso de escrita que estou fazendo, as referências de livros e filmes já somam 2 páginas de caderno. Teve o Emmy e fiz uma lista de séries que nunca tinha ouvido falar e já quero assistir, como Shogun e Griselda…
E ainda nem entrei nos podcast. Acabei de descobrir um sobre mitologia grega e ele entrou na fila do Spotify. Estou atrasada dos episódios da Rádio Novelo e é impossível acompanhar O Assunto, da Natuza Nery ou o do Duvivier, que não lembro o nome. Aliás, anda difícil me atualizar com as notícias de um modo geral. De repente, recebo mensagem de uma amiga e o podcast da Fernanda Lima fura a fila - e acelera a pauta dessa cartinha.
Sério, invejo quem trabalha e escuta tudo isso ao mesmo tempo. Eu perco a concentração. No máximo, quando estou cozinhando, caminhando ou tomando banho escuto os podcasts da vida. Foi assim que terminei O Desconhecido, do Chico Felitti. Nossa, lembrei que tem o novo trabalho da Liniker que quero ouvir… caramba, será que um dia vou zerar essa lista?
Aliás, precisa zerar mesmo? Ou essa batalha é mais uma fantasia dessa vida perfeita, onde todo mundo consome cultura, entretenimento, dá conta da educação dos filhos, dorme, faz exercícios, se alimenta da quinoa vinda da ponte que partiu e afins?
Ao mesmo tempo em que penso isso, bate uma frustração absurda e desproporcional, por não conseguir absorver tanta informação, tanto aprendizado possível.
É amizade verdadeira mesmo?
(talvez Parte 1)
Ouso repetir a introdução porque foi bem assim que ela surgiu. Ela não foi chamada, não pediu licença e chegou chegando. Num primeiro momento, não disse a que veio, aos poucos foi tomando conta de tudo… bagunçou a tabelinha, mexeu com a memória, escancarou o cansaço, mostrou a existência efetiva de cada articulação do corpo e cutucou o prazer sexual.
Em 2019, um dos melhores anos da minha vida, quando cuidei de mim, emagreci, ganhei uma sócia, trabalhei pra caramba, fiz uma viagem familiar linda, dancei 3x na Festa Terapia do DJ Janot lá no Rio, Flamengo foi campeão da Libertadores… E mesmo com um episódio muito triste que mexeu com as nossas vidas no apagar de 2019, não posso negar, foi um ano excepcional.
E foi lá naquele ano, que minha menstruação começou a atrasar (com exceção, obviamente, das duas gravidez).
Surto #1 - Comprei todos os testes de farmácia e ainda pedi um Beta HCG para minha amiga médica. Fui ao laboratório, fiz exame de sangue e não, eu não estava grávida. Eram apenas os primeiros sinais de que, aos 45/46 anos, os hormônios do meu corpo estavam colapsando. Não dei muita importância e segui a vida, me acostumando com essa alternância mês sim, mês talvez, mês não, de um ciclo muito certinho, desde a menarca.
De repente, o mundo começou a acabar. Pandemia declarada, Covid, isolamento social, muitas mortes e um medo generalizado invadiu nossas casas, assim como os novos sintomas do climatério, que chegaram sem a devida cerimônia.
Ainda assim, mantive uma certa sanidade e segui a vida. Alternando entre militância, ações sociais, criação de uma nova marca - nascia a Mandarina - e planos para um futuro promissor e de esperança.
Surto #2 - Veio 2021 e 2022, finalmente abertura, vacina, meu pai vivo e todos os sintomas da agora dita perimenopausa se misturaram num caldeirão explosivo. Muito trabalho, dúvidas, incertezas e burnout devidamente instalado se juntaram à névoa mental, choros constantes, cansaços absurdos e noites mal dormidas.
Por algum tempo, coloquei todos os sintomas em uma mesma caixinha, associando-os ao estresse de abrir um negócio com o despreparo inconsequente desse ato.
No fundo, eu sabia que não era bem assim. E, num lapso de lucidez - ou por ler muito sobre o assunto, quando mulheres maduras usaram a pandemia para relatar sobre o que estava acontecendo com elas -, entendi que era a hora de separar as tais das caixas. Precisava reconhecer que, embora com todo o pandemônio vivido pelo empreendedorismo, meu corpo e minha mente estavam em desarmonia por outro motivo também. Afinal, sou uma mulher e como tal, sou agraciada com essa mais essa confusão hormonal.
Corri para uma ginecologista “especializada” no assunto e iniciei a reposição hormonal, na tentativa de voltar para os trilhos dessa aventura. O estrago já tinha sido feito em quase todos os âmbitos da minha vida. Familiar, profissional, sexual…
Mesmo com a reposição - sabendo que foi uma das melhores coisas que fiz a mim mesma - é difícil reencontrar o caminho. E assim como na maternidade, a gente morre um pouco e tenta renascer, tenta se perceber dessa forma diferente, tenta se reinventar e acreditar que a vida não acabou. Tenta entender que você não secou… pois é, ainda em 2022, em um exame de rotina, ouvi: “está tudo lindo, mas tudo seco, não sai mais nada daí”, disse a médica responsável pelo exame de imagem. Surto #3
Agora, em Setembro de 2024, completo um ano desde a minha última menstruação. Em setembro de 2023, depois de alguns meses sem a visita dela, no dia em que embarquei para a Bahia, ela desceu. Veio com tudo e ficou por aqui durante quase um mês inteiro. Era uma coisa meio: “você vai me aturar até a última gota…”. Pode ser que ainda menstrue em algum momento, até por conta da reposição, caso venha a ficar sem ou mudar o método. No entanto, depois desse ano inteirinho, sem dar um sinal de vida, posso dizer com todas as letras: enfim, sou uma mulher menopausática.
Confesso, estava fazendo uma contagem regressiva para este momento. Foram anos dessa embromação, desse chega não chega, vai não vai… Não ganho nenhuma carteirinha especial ou mais privilégios dos que já tenho. Ganho, talvez, um pouco mais de entendimento do caminho que estou seguindo. Claro, tem um um pouco de raiva, por ter me tirado tanta coisa; um pouco de medo, por saber que é o início do fim (já falei que sou dramática, né?!); e uma grande expectativa desse porvir. Estou viva e tenho muito o que viver!
Até acredito que estamos desenvolvendo uma amizade verdadeira. Nessa arrumação da casa, ao separar as caixas, estou buscando fazer escolhas que priorizem minha saúde física e mental. Assim vou abrindo espaço para me entender melhor e criar esse laço de amizade com ela e comigo mesma.
QUAL É A MÚSICA, PABLO?
Se você me segue nas redes sociais sabe que fui ao melhor show do ano e que chorei, cantei e dancei junto com mais de 20 mil pessoas, ao assistir Caetano e Bethânia reinando soberanos na Pedreira Paulo Leminski.
Fiz uma playlist com as músicas programadas para o espetáculo e algumas muitas versões delas para você aproveitar! Foi lindo. É lindo!
Obrigada por chegar até aqui.
Beijocas e até loguinho
Rê
Você leu minha mente enquanto lia: "precisa zerar mesmo?". Eu tenho lista de série, filme, podcast, livros na estante para serem lidos... acho que tenho material que dura umas três encarnações ainda. hahahha
E agradeço você compartilhar esse tema, tão importante falar sobre menopausa. Pense que voc~e está guiando mulheres que estão vindo depopsi de você (me incluo nessa)!!!
Minha querida irmã dramática.... como é linda a vida! E como cada uma tem a sua... rs... a minha menstruação parou "como para um relógio às 3:45 da tarde." Foi aos 47 anos. Nunca mais veio... e realmente é uma porrada! Fico pensando assim: papai do céu criou um ser mágico mermo! Mas precisava dessa porran de menopausa?! Desnecessário demais!!!!!
Mas estamos vivas!
Como sempre, texto lindo, texto incrível, texto contundente!
Obrigada!